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20+1 Conselhos das crianças para os pais

24.9.20

"Papás, peço-vos que baixem um bocadinho o som da televisão ou que a desliguem mesmo. Aquilo que lá ouvem deixa-vos muito sérios e tristes. Não consigo perceber bem porquê e isso deixa-me um bocadinho preocupado. 

Eu e os outros meninos já voltámos à escolinha e vocês já não estão sempre comigo.

Há muitas coisas que estão diferentes e há muitas regras novas. Gostava de conseguir ver a cara da minha professora mas ela diz que tem de estar mascarada porque o carnaval chegou mais cedo. É muito engraçada ela.

Vocês andam com uma cara muito preocupada e ultimamente só falam do que se passa na escola.

Quero dizer-vos algumas coisas que são muito importantes para muitos papás como vocês e para crianças como eu. Perninhas à chinês e cabelos para trás das orelhas para me ouvirem bem:"

A escola

1. Já vos ouvi dizer que estão com medo que eu vá para a escola – É na escola que eu posso aprender, brincar, aprender a resolver os problemas, sentir que sou capaz, fazer amigos e descobrir que existem pessoas diferentes de mim – Façam-me sentir-me seguro naquele lugar, dizendo bem da escola à minha frente, lembrando-me das coisas boas que acontecem e que aprendo durante o dia;

2. Ajudem a minha professora a conhecer-me melhor, dando-lhe informações sobre as minhas características, interesses, dificuldades e quando tiverem alguma dúvida sobre mim ou sobre a escola perguntem-lhe;

3. Conversem comigo sobre as novas regras da escola e dos espaços públicos para que eu me possa sentir livre em segurança;

4. Tenho medo que se esqueçam de mim na escola, tranquilizem-me dizendo-me todos os dias a pessoa que me irá buscar à escola e em que momento do dia (a antecipação ajuda-me a sentir-me mais seguro);

5. Estive muito tempo sem vir à escola, já me esqueci de algumas coisas que sabia – Dêem-me tempo e ensinem-me novamente sem me fazerem sentir culpado por já não me lembrar;

6. Coloquem todos os dias na minha mochila muitos miminhos, palavras boas, sorrisos, tranquilidade, orgulho e confiança em mim!

7. Quais são as vossas intenções para mim este ano? Escolham com carinho e lembrem-se que eu tenho o meu tempo e o meu ritmo, não me comparem com os outros meninos.

Em casa

8. Nos últimos tempos, estivemos sempre juntos, tive mais a vossa atenção e brincamos muito, continuem a ter um tempinho no vosso dia para brincarmos e fazermos coisas em conjunto;

9. Para me sentir bem e poder viver o dia da melhor forma, preciso de uma rotina certa, principalmente nas horas de descanso. Preparem a minha mochila e roupa no dia anterior e acordem-me com carinho para que as manhãs sejam mais calmas;

10. Definam bem as regras (justas) e exijam-me que as cumpra: Digam-me claramente o que esperam de mim, o que é bom e o que não é bom para mim o que posso e o que não posso fazer – as regras têm de ser claras e coerentes para que as possa compreender e integrar e não tenham medo de me dizer que não – o mundo não será sempre da forma como eu gostaria que fosse;

11. Sejam o meu exemplo – aprendo por observação e por imitação e irei repetir aquilo que aprender com vocês;

12. Escutem com atenção o que eu vos digo – por palavras, por silêncios ou através do que eu faço – Pergunte-me como me sinto, o que gosto e não gosto – a minha opinião tem importância;

13. Conheçam as minhas características e as minhas necessidades para compreenderem melhor o meu comportamento - quando não me sentir compreendido por vocês vou fazer muitas birras;

14. Estejam atentos aos meus sinais - por vezes sinto-me estranho, impaciente, com dores de barriga e de cabeça, talvez tenha medo ou esteja preocupado - estejam atentos ao meu sono, alimentação, controlo dos esfíncteres, alterações de comportamento, comportamentos obsessivos, tiques, desinteresse. Se não passar, procurem alguém para me ajudar;

15. Ajudem-me a descobrir as emoções – falando sobre como se sentem - o que vos deixa tristes, zangados, calmos e identificando as minhas quando eu as estiver a sentir – só assim poderei depois descobri-las sozinho em mim e nos outros e saber o que fazer;

16. No tempo em que tive aulas em casa tive de aprender a ser mais autónomo – aproveitem e continuem a querer que eu faça algumas tarefas sozinho; 

A minha carta aos meus filhos

4.5.20

O mundo lá fora parou.

Mas o nosso continuou.

O mundo ficou em silêncio.

Mas aqui, dentro das nossas quatro paredes, continuou o movimento, as vozes, os choros e as gargalhadas.

O mundo lá fora abrandou.

Mas aqui dentro aconteceram tantas coisas.

Chegou este dia. O dia em que o mundo despertou novamente.

Foram muitas as vezes em que o desejei. Por cansaço, por desespero, por impotência.

E muitas também, as que quis adia-lo.

Apesar de tudo, tranquilizava-me o facto de estarmos só nós. Na nossa bolha. Protegidos. Envolvidos e nutridos pelo nosso amor. Na nossa forma de viver esta fase. Na linha que nos separava entre a magia de acreditar que vai correr tudo bem e a possibilidade de não correr.

Aqui nada de mal poderia acontecer. Nada de mal vos poderia acontecer.

Inicialmente foram tantas as dúvidas, os medos, a confusão na cabeça de cada um. Aos pouquinhos, fomos prestando atenção ao ritmo e ao tempo de cada um e fomos acertando o passo nesta dança da vida que nos obrigou a todos a repensar.

Os dias fluíram entre tarefas, gestão das obrigações, birras, invenções e um carrossel de emoções. Os dias viveram-se num tempo a que não estávamos habituados a ter só para nós.

Vocês estavam mais felizes do que nunca, sem perceberem muito bem porque deixaram de ir à escola, de ver os amigos e a professora, de ter o colo dos avós e a rua para brincar. Sabiam que era por causa de um tal Corona que pode fazer muito mal a todos nós, principalmente às pessoas com mais idade.

Com a vossa sabedoria de crianças, aceitaram e renderam-se ao momento.

Juntos, construímos esse tempo e espaço onde nunca tínhamos estado antes. E se, por um lado, isso trouxe algum desconforto, por outro tenho a certeza que foi um lugar que, por mais anos que viva, nunca iremos esquecer.

Sabem porquê?

Porque foi nele que nos redescobrimos também. A cada um de nós individualmente e a todos, enquanto família.

Que nos despimos de tudo o que também faz parte de nós e da nossa vida, mas que de certa forma não nos pertence verdadeiramente.

Este momento tornou isso bem claro. O tempo das coisas parou e percebemos que a vida são as pessoas, as nossas pessoas.

Um dia quando crescerem e tomarem consciência de que fizeram parte desta "história", irão entender de forma mais clara, aquilo que o vosso coração "pequenino" já sabia mas que a maioria dos adultos já se tinha esquecido e que talvez tenha relembrado por estes dias.

Custa-me a acreditar que haja alguém que esteja exatamente igual ao que era antes de tudo isto começar. Eu não estou certamente.

E, quero confessar-vos que, agora, que se aproxima o dia de sairmos da nossa bolha volto a sentir medo. Por mim, por vocês, por todos nós.

Mas não é nisso que quero pensar agora. Agora quero apenas agradecer-vos por tudo o que me ensinaram nestes dias...

  • Obrigada por me terem ajudado a perceber que as coisas podem esperar, mas vocês não
  • Obrigada por me permitirem olhar-vos de mais perto e ver-vos crescer tal como são, com as vossas qualidades e defeitos
  • Obrigada por me terem dado oportunidade de perceber que continuo a conseguir reinventar-me e a multiplicar-me mais do que imaginava
  • Obrigada por me terem ensinado que um dia feliz pode ser feito de muita brincadeira
  • Obrigada por me terem mostrado que não precisam de uma mãe perfeita mas de uma mãe disponível
  • Obrigada por me ajudarem a repensar onde deve estar o meu foco e a minha atenção
  • Obrigada por poder ver o brilho dos vossos olhos e o sorriso de cumplicidade
  • Obrigada por me mostrarem que as aprendizagens significativas também se adquirem na terra, na cozinha, no ouvir dos pássaros e num "nada para fazer"
  • Obrigada por me fazerem dar mais valor ao silêncio
  • Obrigada por me mostrarem que às vezes o menos é mais e que é na simplicidade que moram as memórias mais felizes
  • Obrigada por me fazerem descobrir que tenho na cabeça um manual de ideias criativas que nem eu própria sabia que tinha
  • Obrigada por me confrontarem com as minhas emoções menos simpáticas, mas necessárias para reconhecerem os meus limites e os limites que a vida nos exige

13 Ideias de (uma boa) Sobrevivência para a quarentena

18.3.20

Os últimos dias, decerto têm sido dias de um grande desafio para todas as famílias com crianças em casa. É verdade que os nossos médicos têm sido verdadeiros heróis na linha da frente, mas logo a seguir vêm os pais que tendo de gerir as suas tarefas profissionais que se mantém, têm também de assumir a tempo inteiro as profissões de educadores, professores, enfermeiros, psicólogos, cozinheiros, artistas, etc. Têm também de gerir não só as emoções das crianças, como as suas num momento em que vivenciamos um período de adaptação a algo pelo qual nunca passamos antes e que nos desperta sentimentos como preocupação, medo, ansiedade.

Será certamente uma fase de aprendizagens para todos. É o tempo de recolhimento e de reflexão sobre a forma como estamos (ou não) ligados uns aos outros e valorizar, sobretudo, a presença e o privilégio da presença de cada um na nossa vida.

Nestes dias passados entre muito colo e mimo, brincadeiras e certamente muitas birras, o mais importante é que possamos estar todos bem de saúde e ainda que a casa esteja um caos, que por dentro possamos ficar mais arrumados e com cada coisa no sítio certo.

Porque ainda vamos no início e a paciência e a criatividade nem sempre esticam, deixamos algumas ideias de sobrevivência para que os dias de quarentena com crianças decorram dentro da maior normalidade possível:
  • Para quem ainda não o fez, explicar às crianças a fase que estamos a passar. Já existem histórias e vídeos na internet para explicar às crianças o que é o COVID19. No final, perguntar se ficaram com alguma dúvida, se querem fazer algum desenho ou trabalho sobre o tema e não voltar a forçar o assunto, respondendo de forma sincera se a criança perguntar algo posteriormente;
  • Evitar ter a televisão ligada o dia todo e expor as crianças às notícias que constantemente são divulgadas. As crianças poderão começar a sintomatizar alguns dos sintomas ou terem crises de ansiedade se estiverem preocupadas ou ansiosas com o tema ou com o stress sentido por parte dos adultos;
  • Manter as rotinas: horas de acordar e de descanso, momentos das refeições, higiene, vestir com a roupa do dia (e não de pijama) – isto estende-se também aos adultos;
  • Manter uma alimentação equilibrada. Cuidado com o excesso de açúcar que para além de ser pouco saudável, é uma fonte de energia (que as crianças já têm acumulada);
  • Fazer uma reunião de família onde se elabora o conjunto de regras da casa e de funcionamento da quarentena, uma lista de atividades e ideias para fazer durante os dias (individualmente e em família) e as tarefas domésticas que cada um pode fazer. Elaborar um cartaz com as regras estabelecidas e um mapa de registo de tarefas para cada um, avaliando diariamente o seu cumprimento;
  • Para os alunos em idade pré escolar e escolar, organizar o dia das crianças distribuindo as atividades pelas várias áreas: atividades pedagógicas, atividades lúdicas, atividades físicas e expressivas e atividades livres (para as crianças com trabalhos para fazer, distribuir equilibradamente o numero de páginas dos manuais, livros de fichas e tarefas pelos dias de quarentena);
  • Definir um tempo para a utilização das tecnologias (1 hora diária para as crianças mais pequenas e 2horas a partir dos 10 anos) – a visualização de televisão não entra neste tempo mas a sua utilização deve ser avaliada pelo bom senso;
  • Manter a casa organizada, definindo um quarto ou um espaço para brincar e um espaço da calma com almofadas, música calma e livros;
  • Abrir as janelas e privilegiar o acesso às varandas, quintal, terraços e jardins de casa para apanhar vitamina D;
  • Elaborar um diário da quarentena em papel ou digital, com o contributo de todos;
  • Utilizar doses extra de amor, de paciência, de tolerância e de brincadeira, exigindo sempre o cumprimento das regras e das tarefas combinadas por todos;
  • Permitir o tempo sem programar atividades, para que as crianças possam entender a importância de gerir o tédio e estimular a sua criatividade;
  • Ter uma comunicação e um pensamento positivo e otimista. Ainda que as crianças possam achar que estes são os seus dias de sorte por poderem ter os seus pais só para eles, eles são observadores muito atentos e absorvem o clima e energia que sentem à sua volta.

De seguida, seguem algumas ideias para aproveitarem o tempo de uma forma divertida:










Páginas online com ideias:

Histórias para o pré escolar - https://historiasparapre.blogspot.com/

Apoio escolar – https://www.escolavirtual.pt/

http://www.quadroegiz.com/

Jogo sobre o Corona Vírus para a família - http://temp.assec.pt/jogos/

Atividades Criativas :

https://casabrincar.blogspot.com/2020/03/ideias-para-brincar-em-casa-e-em-familia.html?m=1

https://www.facebook.com/thedadlab/


Com regras e com amor,

A vossa psicóloga,
Ana Trindade

Pote das ideias

5.11.19
E quando é preciso ter tempo e ideias para tudo e para todos, planear o dia dos miúdos, ter um plano A, um plano B e muitas vezes um plano C, já para não falar das birras, discussões, tarefas domésticas, e ainda assim, ter que ter um colo sempre disponível para qualquer hora do dia...

O dia a dia das famílias é feito de vários e constantes desafios dignos de uma medalha olímpica para todos os intervenientes em que os principais vencedores, na verdade, são mesmo as crianças.

Por muita que seja a criatividade, a paciência e o amor, por vezes torna-se difícil responder a todos os desafios de forma a que o coração de mãe e de pai se sinta 100% orgulhoso nesta tentativa de bem educar e de fazer um filho feliz. Naturalmente, surgem dúvidas e medos de falhar no seu papel de pais. E nos filhos, seguramente, crescem também inseguranças que nascem de um distanciamento cada vez maior em relação aos seus pais e a outras figuras de referência familiar.

O ritmo do dia a dia quer dos pais quer das crianças, as crenças que construímos sobre a parentalidade e a educação, o excesso de tempo e de energia dedicado ao trabalho e o stress têm levado os pais a esquecerem-se de conjugar verbos importantes para um crescimento saudável das crianças, tais como o esperar, o experimentar, o tentar, o pensar, o resolver, o ser e o sentir. Por falta de tempo, de paciência ou como uma compensação da sua ausência física e muitas vezes, emocional, os pais pensam e agem pelas crianças, comprometendo a sua autonomia, a sua criatividade, a sua capacidade de gerir emoções e a expressão do seu ser. Torna-se mais rápido e mais fácil agir por eles. Será?

Com frequência, nós adultos, tentamos encontrar soluções para os problemas das crianças ou investimos vários esforços para que as situações nem ocorram, passando-lhes indiretamente a mensagem de que há sempre alguém que irá resolver as coisas por eles, ao mesmo tempo que, espelhamos a ideia de que eles não são capazes de fazer o que o mundo lhes pede para fazer. Isto tem impacto na (falta) de autonomia das crianças, assim como na (in)capacidade para refletir e encontrar soluções, de criar empatia, de gerir as suas emoções e entendê-las no outro. Estas questões têm preocupado cada vez mais os especialistas na área da educação e do desenvolvimento da criança e do adolescente. Cada vez mais se observam crianças e jovens com ataques de pânico e de ansiedade, com depressões em idades cada vez mais precoces, dificuldades no relacionamento com os outros, com uma auto estima mascarada de um rei que na verdade se sente sapo. A criatividade e a energia canalizam-se para um aparelho que quando termina a bateria leva qualquer um a um estado de birra.
Vejamos estes exemplos: quando há um conflito em casa entre irmãos, tenta perceber o que originou a discussão? Tenta perceber o que sente cada uma das partes envolvidas e incentiva a que os irmãos conversem e encontrem uma solução por eles? Ou o foco está em encontrar um culpado para aquela situação, uma forma de castigar esse culpado e encontrar um penso rápido para a situação, como um “peçam desculpas um ao outro” ou “vão para o vosso quarto pensar no que aconteceu”. Aos fins de semana o tempo é ocupado sempre da mesma forma, ou as dinâmicas são diversificadas? Todas as pessoas da casa são ouvidas quando é preciso decidir alguma coisa, nem que seja como vai ser aproveitado o sábado? Quando alguém está triste, zangado ou comete um erro, como agem de forma a respeitar e a ajudar quem foi visitado por essas emoções?

Nem sempre é fácil ter soluções para as situações que surgem a toda a hora e viver é aprender a encontrar aquelas que são mais ecológicas e saudáveis para cada um e para cada família. Para isso é importante a tomada de consciência de como estamos e para onde queremos ir.

Mergulhados em todos estas solicitações da vida, os pais perdem muitas vezes o brilho e o foco no papel mais bonito que a vida lhes proporcionou que é o de ajudar um ser a crescer e a tornar-se pessoa e, em poder transformar-se juntamente com ele.

A proposta de hoje tem como objetivo ajudar a desenvolver os aspetos referidos em cima de forma a aproximar os vários elementos da família, diversificar as estratégias e dinâmicas familiares e a retirar o foco da resolução das situações das crianças pelos pais, convidando-as a conseguirem encontrar mais autonomamente estratégias para lidarem com as situações nos seus diferentes contextos. Logicamente que as crianças precisam de ser ensinadas a pensar e a ir buscar os seus recursos internos que, poderão precisar de alguns ajustes. Criar estas oportunidades de partilha e de reflexão conjunta, em que todos contribuem com ideias para a harmonia da casa, é um grande passo para melhorar o desenvolvimento das crianças. E já agora, dos adultos também, afinal aprendemos mais juntos do que sozinhos e as crianças têm muito para ensinar aos adultos. 


Educar na era Digital

31.7.19

Os jogos “mamã dá licença?”, “1,2,3 macaquinho do chinês”, “STOP”, saltar ao elástico, subir às árvores ou jogar ao berlinde, são jogos que acompanharam a infância de quase todos nós. Jogos que nos fizeram sair de casa com a certeza de que seriam horas a fio de risadas e a sensação de que o tempo era curto para quem queria sempre mais. Entre uma apanhada e outra, entre um golo falhado e uma cabeça partida, as amizades iam nascendo, a importância de aprender a esperar e que é no contacto com o outro que nos tornamos mais pessoas. Foi através do aprender a brincar que descobrimos que o mundo pode ser um local divertido para crescer e viver.

O sorriso era o reflexo de um corpo feliz, que parecia nunca cansar-se e que estava em constante exploração e descoberta.

Com o desenvolvimento tecnológico, chegaram as televisões, os computadores, os videojogos e mais tarde os telemóveis Nokia com o famoso jogo da serpente. Jogos estes que entusiasmavam, mas que ainda assim, não substituíam o cheiro da terra e o gosto de uma vitória em equipa. Foi o início de um novo ciclo, de uma nova era que parece não dar tréguas e que tem ganho cada vez mais espaço e impacto no dia a dia de miúdos e graúdos, deixando-os cada vez mais dentro de quatro paredes.

O grande desafio dos pais nesta era digital, é o de promoverem uma educação para a tecnologia junto dos seus filhos, e para isso, é necessário que também eles se reeduquem nesse sentido. Tal como em tudo na vida há vantagens e desvantagens, e o equilíbrio é sempre a forma mais sensata de agir. O que se passa é que hoje em dia tudo acontece dentro dos pequenos ecrãs: trabalha-se, faz-se as compras do mês, comunica-se com pessoas que estão a quilómetros de distância, faz-se novos amigos, obtém-se informação sobre qualquer assunto, ouve-se música, vê-se filmes e pode jogar-se com pessoas que estão na sua casa em qualquer parte do mundo.

Tal como uma peça de roupa, estes instrumentos são acessórios sem os quais já não sabemos viver. Nós e eles. As crianças.

Esta expansão tecnológica tem originado várias reflexões sobre as consequências da utilização das tecnologias no desenvolvimento das crianças e jovens, sendo que apesar de não haver consenso entre os especialistas, tem-se concluído que as novas tecnologias podem ser excelentes aliados no desenvolvimento infantil, desde que o acesso aos aparelhos electrónicos seja mediado de forma consciente pelos pais. Se a criança tiver uma utilização pedagógica e controlada das novas tecnologias, poderá tornar-se membro ativo do seu processo de aprendizagem, podendo aprender sobre o que quiser. Acredita-se que o acesso às novas tecnologias estimula a leitura, aumenta o vocabulário e o conhecimento sobre o mundo. Fala-se também, no desenvolvimento cognitivo, com impacto na inteligência. Todavia, Álvaro Bilbao, neuropsicólogo, autor do livro “o cérebro das crianças explicado aos pais”, incita os adultos a uma reflexão sobre o seu próprio uso das novas tecnologias; "Usamos 'smartphones há alguns anos. Quantos de nós se notam mais inteligentes por isso? E, agora, quantos de nós se sentem menos pacientes?".



No que diz respeito à parte lúdica, o facto de as crianças e jovens poderem repetir os jogos e melhorarem a sua performance, dá-lhes uma sensação de controlo e de domínio, e consequentemente um sentimento aparente de segurança.

O irmão mais velho

23.5.19
Carta para o meu irmão:

Olá mano!

Tinha mais ou menos 5 anos quando comecei a perceber que algo de estranho se ia passar. A mãe e o pai andavam muito felizes e as pessoas ligavam a dar os parabéns! Por momentos pensei que podia haver bolo de anos todos os dias, mas nada. Parecido com um bolo só mesmo a barriga da mãe que começou a crescer cada vez mais.

Lembro-me de ter ido a um sítio, em que puseram uma coisa viscosa na barriga da mãe e de repente apareceu num écran uma mancha preta. O pai disse-me que aquele eras tu! Fiquei meio baralhado com a cor da tua pele e parecias um boneco daqueles que há nos supermercados dentro de caixas.

Via o pai e a mãe a falarem com a barriga da mãe, e a dizerem que te estavas a mexer… Não estava a perceber muito bem o que se estava a passar… A única coisa que percebi é que aquela bola dentro da barriga da mãe se chamava irmão. A minha educadora disse-me que ter um irmão era uma coisa muito boa. Não fiquei lá muito convencido…

Confesso que não pensei muito mais no assunto até ao dia em que nasceste. Nesse dia, fiquei um bocado assustado. A mãe tinha muitas dores, respirava com muita força e gritava, o pai muito apressado a ligar à avó para vir cá para casa para ficar comigo. Sairam os dois à pressa. A avó explicou-me que vinhas a caminho…Esperei algum tempo para ver se tocavas à campainha mas até ir dormir não aconteceu nada.

No dia seguinte, o pai veio buscar-me e mostrou-me uma fotografia tua no telemóvel. Achei-te pequenino e muito vermelho, como quando faço muita força. Não percebi muito bem para que servias e o que estavas ali a fazer ao colo da minha mãe. Fui com o pai ao hospital ver a mãe e puseram-te o meu colo. O pai e a mãe começaram a chorar, não percebi se estavam tristes ou contentes. Dessa vez reparei que afinal eras um bocadinho diferente dos bonecos do supermercado e achei-te alguma piada. Foi aqui que te abri as portas do meu coração.

Comecei a perceber melhor quem eras quando fomos para casa e tu… também vieste! Não achei muita piada quando vi que ias dormir no quarto dos MEUS pais, nem quando a família e os amigos dos pais nos visitavam e só olhavam e levavam prendas para ti, ainda por cima eu é que tinha de as abrir. Dessa forma descobri o que no coração de quem gosta de nós, há espaço para todos.

Mesmo assim não me saia da cabeça que já não era assim tão importante para os pais, avós e tios e que eles gostavam mais de ti do que de mim. O que teria eu feito de mal para os pais me quererem substituir? Foi aqui que descobri o que era a insegurança.

Comecei a achar ainda menos piada quando eu não podia fazer barulho nem ia ao parque porque tu estavas a dormir ou tinhas de mamar. Mas é que não fazias mais nada!! Para além disso estavas sempre ao colo de alguém… onde eu também gostava de estar! Foi assim que descobri o ciúme.

Ás vezes ouvia-te chorar e sentia vontade de te pôr a chucha, os pais diziam que te acalmavas com a chucha e resultava mesmo. Foi assim que descobri a preocupação e a vontade de ajudar-te e de ver-te bem.

Os pais diziam a toda a gente que tu eras muito mais calminho do que eu tinha sido quando era pequenino, enquanto sorriam para ti todos babados.

Por momentos tive vontade de ser um bebé como tu… a mãe contou-me que nessa altura voltei a fazer chichi na cama, e que também pedi para ter chucha outra vez. Também fiquei algumas vezes de castigo pelas birras que comecei a fazer. Assim descobri que ser crescido e saber resolver as dificuldades faz parte da vida.

A mãe deixou de ter tanto tempo para mim, explicou-me que naquela altura eras muito pequenino e que precisavas de muita atenção e cuidado mas que gostava muito que eu a ajudasse a cuidar de ti. Perguntei se podia ser só depois de ver a “patrulha pata” e ela riu-se. Ficavas ao pé de mim enquanto eu via televisão e a mãe e o pai preparavam o nosso jantar. Foi assim que descobri que o tempo ao teu lado também pode ser bom.

Nunca consegui mudar-te a fralda…Cheiravas mesmo mal!! Mas segurava a tua mão para não chorares com o frio. Às vezes a mãe esquecia-se do teu creme e saia do quarto para ir buscar. Tinha de ficar lá contigo para olhar por ti… Nesses momentos descobri a responsabilidade de ser teu irmão. E quer acredites, quer não, isto nunca mais desapareceu…

Deixou de ser a mãe a dar-me banho, a preparar-me o pequeno almoço de manhã e levar-me à escola. No início achei estranho, mas foi fixe poder passar mais tempo com o pai e fazer mais coisas com ele. O pai dizia que tínhamos de ter muita paciência e que era só uma fase. Aqui descobri que gostava mais do pai do que pensava.

Todos diziam que ser o irmão mais velho era muito importante e muito bom… não percebi porquê até ao momento em que começaste a sorrir para mim quando eu chegava ao pé de ti e a dar gargalhadas quando te fazia caretas. Em que choravas quando eu ia para a escola, ou os teus braços se estendiam para vires para o meu colo. Os teus primeiros passos também foram para vires até mim. Nesses momentos, descobri o carinho e o amor por ti.

Quando começaste a andar e conseguias apanhar, brincar e estragar os meus brinquedos, tinha vontade de te matar! Nesses momentos descobri a raiva mas também a paciência!

Os dias, os fins de semana, as férias, o banco do carro, a casa da avó, o colo dos pais, o meu quarto, as minhas roupas, tudo começou a ser, de repente, ocupado também por ti… Mas eras meu irmão, era o momento de perceber o que é a partilha.

Entraste para a mesma escola que eu, e de vez em quando ia espreitar-te à sala e ao recreio. Quando via alguém meter-se contigo tinha vontade de ir a correr e defender-te mas lembrava-me do que o pai e a mãe dizia: tinhas de aprender a resolver as coisas sozinho. Nesses momentos descobri que não poderei sempre proteger-te das quedas mas que estarei sempre aqui para te ajudar a levantar.

Mentiria se dissesse que não eras muito chato quando andavas sempre atrás de mim, só querias brincar comigo e imitavas-me no que eu dizia e no que fazia (ainda hoje fazes isso) mas foi assim que descobri o que é ser um exemplo para alguém!

Fomos crescendo e apresentavas-me com orgulho aos teus amigos, perguntavas-me a matéria da escola porque dizias que só eu te conseguia ensinar, querias os meus conselhos, falavas-me sobre as tuas namoradas ou sobre as tentativas falhadas e tentavas convencer os pais a tirarem-me do castigo quando às vezes discutíamos ou brigávamos. Como eu era o mais velho tinha sempre a culpa. Foi aqui que descobri o companheirismo e a amizade.

Ainda muitas coisas irão acontecer na nossa vida, poderás continuar a ser o filho ou o neto preferido da mãe e dos avós, seremos pais dos nossos filhos, os nossos pais irão envelhecer e seremos só nós depois, não estaremos de acordo em muitas coisas e seremos sempre diferentes, mas uma coisa é certa, é bom saber que este caminho é feito ao teu lado. 



Dicas para ajudar na adaptação do irmão mais velho à chegada do novo irmão:

  • Envolver o irmão mais velho na evolução do bebé na barriga da mãe, participar em ecografias, promover a interação com o bebé dentro da barriga;
  • Permitir a participação na escolha do nome e noutras decisões relativamente ao quarto, roupa e brinquedos do bebé; 
  • Antecipar de forma gradual as mudanças na rotina do irmão mais velho (o quarto/cama, se é a mãe a dar banho e a adormecer, essa tarefa começar a ser feita também pelo pai, se entrar para a creche/JI fazê-lo antes do nascimento do irmão); 
  • Aceitar, sem julgar o filho mais velho, que o ciúme faz parte desta fase e ajudá-lo a verbalizar o que sente, seja esse sentimento de ciúme, de insegurança ou de alegria; 
  • Validar e dar nomes aos sentimentos da criança “sei que está a ser difícil esta mudança…”, “sei que gostava que tivéssemos mais tempo só para nós…”; 
  • Após o nascimento, convidar o irmão mãos velho para participar nas rotinas do bebé (dar banho, preparar o biberão, escolher a roupa, ajudar na muda da fralda), elogiando-o pela sua capacidade de ajudar a cuidar do irmão; 
  • Enquanto fala com o filho mais novo, referir a sorte que tem por ter um irmão que cuida dele e que tem tantas coisas para o ensinar; 
  • (Especialmente para a mãe nos primeiros meses: encontrar pelo menos 15 minutos diários com a criança mais velha, enquanto o bebé dorme ou o pai está com ele, dando—lhe a possibilidade de escolher a atividade que quer fazer consigo – ler a história, dar banho, jogar, ajudar nos TPC, luta de cócegas ou de almofadas); 
  • Evitar responsabilizar o irmão mais velho pelo irmão mais novo, exigindo-lhe que faça tudo bem porque tem de dar o exemplo (isto pode levar a que o irmão mais velho sinta pressão e veja o irmão como um fardo); 
  • Valorizar as características de cada filho, evitando as comparações (de forma a evitar o sentido de competição entre irmãos); 
  • Se o irmão mais novo estragar algum brinquedo, sejam advogados de defesa, explicando que o irmão mais pequenino não fez por mal, enquanto tentam arranjar o brinquedo; 
  • Dividir de forma equilibrada o tempo e a atenção entre os filhos. Ter mais idade, não significa precisar de menos atenção. 


Se os comportamentos desajustados do irmão mais velho influenciarem o bem estar da família e permanecerem no tempo, pode ser importante procurarem ajuda de um especialista, para que possam viver esta fase de forma mais tranquila.

Com regras e com amor,
A vossa psicóloga,

Ana Trindade

PAIS “HELICÓPTERO”

18.4.19

Quando as crianças começam a dar os primeiros passos sozinhos, quando começam a comer a sopa sozinhos, quando passam da fralda para o penico ou para a sanita ou quando começam a falar, isso geralmente provoca nos pais uma sensação de muita alegria. A constatação de que os filhos estão a crescer e a tornarem-se autónomos tem um sabor agridoce, provocando por um lado, medo e, por outro lado, uma doce sensação de realização. Dizemos aos nossos filhos que estão a ficar muito crescidos quando aprendem a fazer algo novo ou quando já conseguem fazer algo sozinhos que antes carecia de ajuda. Eles, muito orgulhosos de si próprios gostam de espalhar a boa nova por toda a gente: “já sei lavar os dentes sozinho”, “já sei vestir-me sozinho” “a mamã diz que eu sou um crescido porque já não faço birras” e é assim pela vida fora, quando entram para a escola, quando terminam o curso, quando tiram a carta e compram o primeiro carro, quando conseguem o primeiro emprego, quando casam, quando têm filhos, etc.

Ajudar um filho a tornar-se autónomo e independente, capaz de fazer o seu caminho e alcançar os seus sonhos, é uma das principais recompensas e alegrias dos pais. Ou pelo menos, deveria ser.

Os pais “helicóptero”

O “overparenting”, “pais helicóptero” ou “maternidade de estufa” são termos utilizados para definir um perfil de pais nascidos a partir da década de 60/70 que começou a ter os seus filhos na universidade por volta dos anos 90/2000. Estes pais são superprotetores dos seus filhos, sempre na frente de combate para antecipar ou resolver problemas ou situações relacionadas com os seus filhos. São pais que supervisionam e controlam constantemente as atividades dos filhos, dando-lhes pouco espaço para explorar e descobrir livremente a vida e o mundo. Estes pais dão poucas oportunidades às crianças de correrem riscos, fazerem as suas escolhas e poderem aprender com os desafios da vida.

Os pais “helicóptero” são também extremamente exigentes com tudo. Educação, disciplina, desempenho académico, amizades, namoros, etc. Os filhos têm que se distinguir em tudo e serem os melhores, sendo que falhar ou desistir não são opções. E para tornar tudo isso como garantido, estão lá os pais sempre com as mangas arregaçadas, para garantir que nada corre mal. Mas não deveria ser esta a missão dos pais? Ajudar a que os filhos tenham o maior sucesso em tudo? Não, necessariamente. Aprender a caminhar pelos seus próprios pés e a lidar com os desafios da vida, é uma das maiores garantias de sucesso na vida.

Se por um lado, é aceitável que as crianças pequenas poderão precisar de ajuda e supervisão para as suas aprendizagens, ainda que de forma equilibrada, torna-se difícil imaginar este controlo na idade adulta. Pais como estes, entram nas faculdades, para pedirem satisfações aos professores pela nota obtida numa determinada disciplina. Pais como estes, entram em concursos de televisão para escolher uma namorada para os seus filhos. Pais como estes, cortam as asas aos seus filhos para crescerem de forma autónoma e saudável.



Dentro da categoria dos “pais helicóptero”, os psicólogos definiram três tipologias que se distinguem entre si pelo nível de proteção:

- os pais que estão constantemente a “pairar” sobre os filhos e a intervir limitando profundamente a sua capacidade de escolha;

- os pais que fazem questão de fornecer orientações, que apontam o caminho que consideram mais adequado mas sem limitar completamente a capacidade de decisão dos filhos;

- os pais que perante uma situação de perigo ou crise, intervêm para proteger os filhos até que estes se sintam com capacidade para seguir o seu caminho.

Este perfil de parentalidade surge como consequência das mudanças na sociedade, em que se passa de uma educação muito autoritária, baseada no medo, para uma educação demasiado liberal em que as regras e o papel de cada um na hierarquia familiar está pouco ou mal definido. As evoluções tecnológicas que permitem que a toda a hora e a todo o momento se possa estar em contacto, a mudança da estrutura familiar sendo que há cada vez menos filhos por casal e em que muitas vezes, o nascimento de uma criança resulta de um grande investimento a todos os níveis por parte dos pais. As crianças tornam-se, assim, tesouros e joias preciosas, que devem ser preservadas a todo o custo. As exigências laborais às quais os pais estão sujeitos e que levam à falta de tempo e de paciência para estar presente e disponível para a família, contribuem para que se confunda o estabelecimento de regras e de limites com a falta de amor e em que se tenta compensar os filhos com opções pouco benéficas para o seu desenvolvimento. É importante não esquecer que estes pais estão a educar crianças e jovens numa sociedade que é cada vez mais heterogénea e aparentemente mais “aberta”, mas onde existe, mais do que nunca, uma pressão para a perfeição e para a excelência e onde a concorrência é cada vez maior e mais acentuada. Parece não haver tempo e espaço para o erro. Temos todos de aprender e saber o mesmo, e que se salve o melhor. 

8 dicas para ajudar os nossos filhos a lidarem com as emoções

6.3.19

Inteligência Emocional: Ouvir as Emoções

Numa sociedade que privilegia o conhecimento cognitivo, numa vida preenchida de compromissos, em ruído constante, há pouco tempo e espaço para olhar para as emoções. Saber identificar as emoções, os seus sinais e definir estratégias adaptativas e saudáveis para vivenciá-las, parece não ter sido uma prioridade do ser humano nos últimos tempos. E, como todos observamos, isso tem trazido as suas consequências. Basta olharmos à nossa volta e prestarmos atenção ao que se está a passar no mundo, investigarmos sobre os dados de consumo de drogas e medicamentos psicotrópicos, taxas de suicídio e de violência conjugal, observarmos o comportamento das pessoas enquanto estão no trânsito, nas filas do supermercado, onde a intolerância grita cada vez mais alto. E porque as crianças, são o reflexo daquilo que veem, podemos observar o que se está a passar com as nossas crianças e jovens, recorrendo cada vez mais a especialistas com sintomas de ansiedade, de depressão, a indisciplina nas escolas, as queixas de bullying e cyberbullying, demonstrando uma enorme dificuldade de criar empatia com os outros cada vez mais cedo.

As boas notícias são que no seu desenvolvimento, o ser humano possui as ferramentas necessárias para quebrar este padrão, caso seja estimulado nesse sentido.

Mostrar o que se se sente é para os fracos(?!)

Historicamente, o conhecimento das emoções foi sempre algo desvalorizado, pois as emoções eram vistas como algo a esconder, a reprimir, eram encaradas como um sinal de fraqueza. Pode dizer-se que têm havido bastantes evoluções no que diz respeito à alfabetização literal (através da escolarização), da alfabetização funcional (capacidade de utilizar os conhecimentos adquiridos, no sentido de se utilizarem as tecnologias e os processos que as sociedade modernas exigem), mas não tanto no que diz respeito à alfabetização emocional (capacidade de compreender e gerir as emoções). Já Charles Darwin, na sua obra, falou do papel das emoções para a sobrevivência e têm sido vários os autores a valorizar o papel das emoções. Foi Daniel Goleman, na década de 90 que nos fez refletir sobre a importância da inteligência emocional (aspetos como a motivação, auto controlo, gestão de emoções e empatia) para uma vida mais equilibrada e bem sucedida. Goleman, referiu que a inteligência cognitiva contribui em média entre 10 a 20% para o sucesso, sendo os restantes 80/90% atribuídos à inteligência emocional, dando alguns exemplos de líderes cujo QI era bastante elevado, contudo o seu QE estava pouco desenvolvido, verificando-se um impacto negativo na sua vida pessoal e profissional. Começou a questionar-se se ter boas notas ou conseguir resolver uma equação de um grau de dificuldade elevadíssimo, era realmente fator de sucesso e consequentemente, de felicidade e de bem estar?!

Embora a evolução da validação da importância das emoções, esteja a ser um processo lento, começa a haver um chamamento neste sentido, havendo cada vez mais pessoas a recorrer à psicoterapia, terapias alternativas, mindfulness, atividades de autoconhecimento, etc., procurando ajuda para fazer uma viagem dentro de si, dando-se a si mesmos a oportunidade de descobrir caminhos que estão fechados à muito tempo. As alterações dos referenciais do sistema educativo português também caminham neste sentido, prova é o perfil do aluno do seculo XXI, cujas competências lá mencionadas vão nesta direção.

O exprimir aos outros o que estamos a sentir, não é uma questão lamecha, como muitas pessoas ainda considera, mas uma questão de comunicação básica que nos permite interagir de forma adequada e saudável com os outros, evoluir e sobreviver emocional e fisicamente.

O que são emoções e qual o seu papel?

A palavra “emoção”, proveniente da palavra latina “emovere”, significa impulso que convida a atuar. Conforme a emoção que sente, o indivíduo, tenderá a agir de um determinado modo, numa dada altura (Moreira, 2001). A forma como recebemos a informação do meio, desencadeia uma emoção e uma interpretação dessa experiência. Por exemplo, quando recebemos um abraço da mãe, a emoção que sentimos poderá ser a de amor e calma, o que faz com que avaliemos essa situação como algo agradável para nós. A tomada dessa consciência, poderá fazer-nos ter vontade de repetir essa experiência com a mãe e com outras pessoas de quem gostamos. Por outro lado, o medo, poderá ajudar-nos a perceber que nem todas as pessoas são de confiança e que não devemos abraçar todas as pessoas. A mesma situação pode ser vivida de forma diferente por cada pessoa/criança.

Normalmente dividem-se as emoções em emoções positivas e negativas, atribuindo-se uma avaliação depreciativa às emoções como o medo, a raiva, a vergonha, a frustração, a tristeza, etc. Todavia, é importante explicar às crianças que todas as emoções são importantes e devem ser expressadas (de forma adequada), podendo umas ser agradáveis e outras desagradáveis. Quando colocamos as emoções numa escala de “boas” e “más”, as crianças irão tentar corresponder apenas às boas, tendo dificuldade em assumir as emoções “más”. Por outro lado, também se irão sentir “crianças boas” quando expressam emoções agradáveis e “crianças más” quando expressam emoções desagradáveis. Isto leva a que muitas vezes as crianças construam imagens erradas acerca de si próprias e que reprimam as emoções desagradáveis para não desiludir os pais ou figuras de referência, guardando tudo isso no seu inconsciente que depois se manifesta das mais diversas formas: descontrolo dos esfíncteres, desobediência, birras, desconcentração, desmotivação, ansiedade, depressão, entre outras.

 

As emoções poderão ter várias funções, destacando-se, entre outras:

😊 Sobrevivência – O bebé chora para que as suas necessidades básicas sejam satisfeitas, para que possa sobreviver. Cada emoção tem a sua função de sobrevivência: o medo ajuda a proteger-nos de situações perigosas, a raiva a identificar os nossos limites e a expressá-los aos outros, a alegria promove sensações de bem estar e de sentido à vida, a tristeza faz-nos desacelerar, e ajuda no recolhimento e introspeção, sendo muitas vezes o motor para mudar algo que precisa de ser mudado. As emoções funcionam como motor das nossas ações, e consequentemente na nossa motivação, sendo esta indispensável à sobrevivência.

😊 Personalidade – A forma como construímos o padrão de regulação das emoções, contribui para a formação da personalidade. Se a criança aprende a reprimir a emoção Amor, isso irá influenciar a sua personalidade na medida em que é mais ou menos carinhosa, mais ou menos disponível para o afeto.

😊 Ligação e confiança com os outros -Desde bebés, quando as nossas mensagens resultam numa resposta, a nossa ligação aos outos desenvolve-se. É no reconhecimento das suas emoções e dos outros, que a criança compreende o seu mundo interno e o do outro, é onde existe espaço para a empatia (colocar-se no lugar do outro) e para a construção de relacionamentos com base na confiança e na verdade. É através da segurança que a criança estabelece com o outro e com o mundo, que se irá desenvolver a sua autoconfiança.

Quando é que se desenvolvem as emoções?

Logo após o nascimento, os bebés revelam sinais de perturbação, interesse e repugnância. Nos meses seguintes, estas emoções primárias diferenciam-se em alegria, raiva, surpresa, tristeza, vergonha e medo. A emergência destas emoções parece ser guiada pelo “relógio” biológico da maturação do cérebro (Papalia, Olds, Feldman, 2001). O calendário emocional pode ser alterado por experiências ambientais extremas: crianças maltratadas demonstram medo vários meses antes de os outros bebés (Gaensbauer & Hiant, 1984). Emoções tais como a empatia, ciúme, embaraço, culpa e orgulho, emergem a partir do 2º/3º ano de vida, após o desenvolvimento da autoconsciência. Nesta faixa etária, com a tomada de consciência que “eu” sou uma pessoa, permite que as crianças reconheçam a existência do outro, as suas necessidades e sentimentos, ainda que não sejam ainda capazes de colocar as necessidades do outro em igualdade com as suas.

Um bebé quando nasce, sem conseguir falar, consegue exprimir a sua emoção, e quem é pai/mãe reconhece que, embora incomodativo, o choro é importante na identificação das necessidades dos bebés. O choro pode estar associado à fome, raiva ou frustração e normalmente, os pais, conseguem distinguir o tipo de choro. Com o desenvolvimento, as necessidades e as emoções começam a complexificar-se, contudo até completar cerca de 1/2 anos a criança, ainda não fala. Muitas são as vezes em que os pais desejam que as crianças comecem a falar para poderem dizer o que estão a sentir.

As crianças tendem a ter uma expressão das emoções muito maior do que os adultos, ainda que possa ser pouco adequada aos contextos em que está. Esta adequação desenvolve-se com a capacidade de autorregulação e autocontrolo da criança, que surge por volta dos 3 anos, e necessita de ser ensinada pelas figuras de referência da criança. O feedback que a criança recebe do exterior relativamente à forma como os pais lidam com as suas próprias emoções e a aprendizagem que faz sobre o que está a sentir são o primeiro passo para a regulação emocional.


Os filhos não salvam casamentos

31.1.19


A decisão da paternidade, quando feita em consciência, é o maior ato de coragem e de amor que alguém pode ter. É também a mais profunda oportunidade da vida para se visitar os lugares mais assustadores e mais bonitos do coração.

Quando nasce uma criança, nasce consigo uma mãe, um pai, um irmão (quando é o caso), toda uma nova família. O processo repete-se com cada criança que cada família recebe, pois as características das crianças, a experiência dos pais e o momento da vida do nascimento, tornam cada situação única.

Que mulher nasce numa mãe quando sente o seu bebé a crescer dentro de si e a depender de si para viver? O que sente o homem que deixa de ser o centro das atenções da mulher com quem escolheu partilhar a vida? O que acontece a uma relação que soma novos elementos à sua equação a dois?
Porque é que as pessoas têm filhos?

A resposta a esta questão tem sofrido algumas alterações ao longo do tempo, de acordo com a evolução da sociedade, da ciência e da industrialização. Se nas sociedades agrárias, as famílias tinham muitos filhos e a taxa de mortalidade infantil era muito elevada, ter vários filhos aumentava a probabilidade de alguns atingirem a maturidade e ajudarem as suas famílias no trabalho.

No que diz respeito aos tempos atuais, a perspetiva de ter filhos é vista de formas distintas. Nos Estados Unidos, foram estudados 600 casais nos primeiros 6 anos de casamento e a maioria via as crianças como uma necessidade de ter “uma verdadeira vida familiar”, como fonte de amor e afeto e como amortecedores contra a solidão. Contudo, também viam desvantagens na parentalidade: mudanças no estilo de vida, custos financeiros e problemas de carreira para as mulheres. Quase metade destes casais avaliaram outros valores – uma carreira satisfatória, tempo para estar com o cônjuge, dinheiro extra ou uma casa arrumada e ordenada – tão ou mais importantes do que ter filhos (Neal, Grout, & Wicks, 1989). Outro fator determinante é a continuidade da espécie e do código genético de cada indivíduo. 



A Mãe e o Pai

De acordo com Papalia, D., Olds, S.W., Feldman, R.D. (2001), a decisão, o momento e as circunstâncias da parentalidade podem ter vastas consequências para uma criança e para o respetivo casal. Se um nascimento foi planeado ou acidental, se a gravidez foi desejada ou não, a idade dos pais, o relacionamento do casal, as expetativas em relação à parentalidade, as condições socioeconómicas, etc.

A carta ao Pai e à Mãe (Natal)

12.12.18

Era uma vez um menino, que como tantos outros meninos, foi convidado na escola a “escrever” uma carta ao pai natal, uma vez que se aproximava uma data tão esperada e especial para os meninos da sua idade (e não só).

Mas aquele menino, pensou, pensou, pensou e decidiu que não queria “escrever” uma carta ao pai natal… afinal de contas não era o pai natal que lhe poderia trazer o que mais o fazia feliz neste natal… Perante esta decisão, a professora perguntou ao menino, que trabalho ele gostaria então de fazer em vez de escrever a carta ao pai natal: - “quero escrever uma carta ao pai e à mãe”, respondeu.

Muito bem, vamos então escrever uma carta ao pai e à mãe, o que lhes queres tu dizer? – perguntou a professora ao menino.

O menino muito decidido, começou então a dizer: “Olá papá e mamã, como acham que me portei este ano? Eu acho que sem ser algumas vezes em que não quis tomar banho e que escondi os brinquedos do mano, me portei muito bem… Estive a pensar e acho que o meu quarto já está cheio de brinquedos, já tenho os meus preferidos. A professora diz muitas vezes que os pais deviam dar mais atenção aos filhos e passar mais tempo com eles… Sabem, eu acho que ela tem razão. Neste natal, gostava de vos pedir que brinquem mais comigo, com tempo e paciência, que me levem a passear ao parque e estejam lá mesmo comigo, por vezes não vos sinto lá. Sinto falta do vosso colo, das cócegas que provocam gargalhadas, que olhem mais para mim e para o mano do que para o telemóvel. Preciso que tenham mais paciência, sabem que quando gritam, eu fico nervoso?! E isso deixa-me mesmo assustado… Também gostava que acreditassem mais vezes em mim! Gostava que saltassem comigo na cama aos sábados de manhã e me ensinassem a fazer bolachinhas de chocolate. O meu coração enche-se quando me dizem que gostam de mim e que se sentem orgulhosos de mim cada vez que marco um golo no futebol. Também vos quero pedir que sejam mais amigos e discutam menos um com o outro. Não gosto de ir para a cama e ver que estão zangados um com o outro. Ser crescido não parece ser assim tão divertido. Por agora é tudo, se não conseguirem nenhuma destas coisas, ou menos escolham um jogo para podermos jogar todos. Não quero brinquedos para me ocuparem. Acham que exagerei nos pedidos? Se o pai natal visse isto, talvez dissesse que sim… mas não custa tentar! Amo-vos muito. “
Este menino ainda não sabia escrever todas aquelas palavras, foi a professora que transcreveu as suas e ao perceber o quanto aquela carta poderia ser importante, decidiu chamar cada menino para que também pudesse escrever a sua carta ao pai e à mãe, no Natal.

Esta história, pode repetir-se em cada uma das nossas casas, experimentando fazer este exercício com os seus filhos que já se conseguem exprimir, paralelamente à carta ao pai natal. Talvez fique surpreendido com os pedidos que eles irão fazer. Acredito que a maioria estarão ao seu alcance.

As crianças são simples, na sua essência, precisam de pouco para serem felizes. A comunicação social e a publicidade, impõe às crianças, necessidades que eles não têm. E nós, adultos, permitimos que o consumismo domine o nosso dia a dia, contribuindo para que as crianças sintam que o muito é sinónimo de melhor. Esquecemo-nos muitas vezes que o menos pode ser mais.

Então, neste natal, reconecte-se consigo e com a sua família, decida em consciência relativamente aos presentes que irá oferecer (lembre-se que o essencial custa pouco) e oiça a voz das crianças, elas levam-nos sempre para a simplicidade das coisas. 

Look
BabybyPiki
A
lecrim
Pés de Cereja
Fotografia 
Centrimagem 


Festas Felizes!

Com regras e com amor,
A vossa psicóloga,

Ana Trindade

Parentalidade (In)consciente

1.11.18

Ama-me mais quando menos o mereço. É aí que mais preciso” 
(provérbio sueco) 

Sente-se num local calmo e pare um pouco. Feche os olhos. Preste atenção ao ar que entra e que sai pelo nariz. Permita-se esquecer de onde está, de como foi o dia, das tarefas que ainda tem de fazer. Sinta só a sua respiração. Imagine que os seus pensamentos são barcos num rio que corre. Deixe-os fluir. Não entre em nenhum desses barcos, não se apegue a nenhum pensamento. Entre em contacto consigo. Fique assim o tempo que desejar. Quando se sentir calmo/a, faça-se as seguintes perguntas: “Quais são as minhas intenções enquanto pai/mãe? Que tipo de pai/mãe quero ser para os meus filhos?”, “Em que momentos eu e os meus filhos somos felizes?”.
Se fizer sentido, registe num papel as respostas que surgiram e guarde-o num local acessível para que possa recordar sempre que quiser.

Sobre a Parentalidade (In)consciente

Passamos muito tempo da nossa vida em piloto automático. Entre as rotinas e o percurso casa - escola dos miúdos – trabalho - escola dos miúdos – futebol – natação – casa (na versão mais reduzida), achamos que sobra pouco tempo e energia para prestar atenção aos padrões de comportamento individuais e parentais, aprendidos ao longo da vida. Digo achamos, porque na verdade há sempre tempo.

Empurramos para debaixo do tapete, encontramos causas exteriores para justificar o que não está a correr tão bem nas nossas vidas e no comportamento das crianças que teima em não melhorar. As coisas lá vão andando, disfarçadas pela tomada da medicação que aumenta cada vez mais nos miúdos e nos graúdos.

As escolhas que fazemos (ou não fazemos) e os padrões comportamentais que mantemos têm consequências na nossa vida. No que diz respeito à parentalidade, a história repete-se e intensifica-se, tendo um impacto imediato na educação das crianças, na relação que se estabelece com os filhos e na formação da personalidade dos mesmos.

Cada um ensina aquilo que é, e mesmo que tente ser uma coisa que não é para os seus filhos, rapidamente eles vão sentir e perceber isso, o que terá um impacto negativo na relação que irão construir. Uma criança respeita e valoriza as pessoas que admira e que são congruentes entre o seu discurso e as suas ações. Isso transmite-lhes segurança e confiança, ingredientes determinantes para um desenvolvimento socio emocional saudável e para o estabelecimento de vínculos fortes e positivos.

Este caminho na tomada de consciência daquilo que se é enquanto pai/mãe de uma criança, está na base da parentalidade consciente. Este conceito, influenciado pelas teorias do vínculo e da autodeterminação descendentes da psicologia e pelos princípios do mindfulness (atenção plena), está muito mais ligado a perguntas do que a respostas. Assenta no questionamento sobre as crenças, ideias, hábitos, valores e comportamentos que aprendemos ao longo da vida e que muitas vezes integramos sem refletirmos sobre eles, perpetuando-se naquilo que transmitimos aos nossos filhos. Assim, “a parentalidade consciente é muito mais sobre desaprender do que sobre aprender”.

Em jeito de exemplo, vejamos as seguintes situações: A maioria das famílias, força as crianças a comerem sopa nas refeições porque para a sociedade isso é o certo. E se para o seu filho, esse momento da refeição for sempre uma situação de conflito e de tensão? Será que vale a pena insistir? Em vários países, as crianças não comem sopa à refeição, havendo outras formas de introduzir os legumes na alimentação das crianças.

Quando a criança rejeita dar dois beijinhos a pessoas que acaba de conhecer, isso é encarado por si com tranquilidade ou sente-se posto em causa relativamente à educação que dá aos seus filhos? Pense no que acontece consigo. Sente-se sempre confortável ao cumprimentar na face as pessoas que conhece? Provavelmente a resposta é não e com certeza que com algumas pessoas estende instintivamente a mão em vez de estender a cara.

Com as crianças é a mesma coisa.

A questão é que com as crianças, temos tendência para olhar para o comportamento e não para a sua causa. Recuemos um pouco à infância: quando os bebés choram, enquanto pai/mãe tenta perceber a origem do choro: se é fome, sono, se a fralda está suja, se está um ambiente demasiado barulhento, se há uma necessidade de aconchego, etc. Ao identificar a causa, tenta satisfazer as necessidades do bebé, acabando este por se acalmar e o choro termina. É assim que a conexão entre pais e filhos se constrói e se fortalece. Por esta altura, o seu foco são as necessidades do bebé e prevalece uma relação empática com o seu filho, colocando-se frequentemente no seu lugar e tentando responder às suas necessidades para que se sinta bem.

“A partir dos 18 meses, aproximadamente, a pergunta essencial deixa de ser o «porquê» e passa a ser o «como». A principal preocupação começa a ser a boa educação e não a curiosidade em perceber qual a necessidade insatisfeita que causa o comportamento.” (Ovén, Mikaela, 2015). É aqui que começa o fosso entre os pais e os filhos e grande parte das birras e conflitos surge devido a este desfasamento.

Assim, à medida que as crianças crescem, a tendência é para deixarmos de olhar tanto para a origem ou causa do comportamento e sim para o comportamento em si, que por norma é alvo de julgamento e de um castigo/consequência. A maioria dos pais foca-se mais em encontrar técnicas e estratégias para controlar ou castigar esse comportamento, do que em identificar as necessidades que não estão a ser atendidas e as emoções que estão por trás de determinado comportamento. 


É aqui que começa o fosso entre os pais e os filhos e grande parte das birras e conflitos surge devido a este desfasamento.

A nossa casa a nossa primeira escola

25.9.18

"Lisboa, segunda feira, 8:30 da manhã, hora em que está marcada a saída de casa. A mais nova, com um aninho, ainda ao colo, choraminga, não tirando os olhos da mãe. Parece pressentir que chegou o momento de trocar a casa da avó pela creche. O mais velho arrasta uma mochila de rodinhas, carregada de medos e de curiosidades sobre a nova etapa da sua vida. Dali a alguns minutos, os seus três aninhos irão valer-lhe para enfrentar um espaço, já visitado, mas ainda tão desconhecido e com tantas novidades para assimilar.

A mãe e o pai, para além da marmita, carregam um aperto que parece não caber no peito, e um nó no estômago de quem enfrenta o medo da vida.

O relógio que não para, acelera os pensamentos e os movimentos para que possam chegar a tempo da hora combinada para o acolhimento na nova escola… o pai fica com o mais velho, a mãe não arreda pé da mais nova.

Hoje, excecionalmente, os pais poderão levar as crianças às respetivas salas, e ver mais uma vez de perto, os espaços, os adultos e as crianças que irão partilhar brincadeiras e aprendizagens com os seus filhos. O momento da despedida chegou: à mais nova, um beijinho discreto depois de uma pequena brincadeira com a mãe no tapete da sala, ao mais velho, um abraço carinhoso e as duras mas firmes palavras “a mãe vem buscar-te antes do almoço, vai correr tudo bem”. A adaptação será progressiva: as crianças ficam só o período da manhã, depois introduz-se o almoço, depois o lanche, e no final da semana já são as crianças a pedir para ficar mais um bocadinho na escola.

Pai e mãe encontram-se novamente no carro, um abraço apertado e silencioso que se falasse diria o quanto é bom e ao mesmo tempo difícil ver os filhos crescerem e voarem pelas suas próprias asas.

Nenhum telefonema da escola, apenas os sorrisos no momento do regresso a cassa. Nesse dia, tudo correu bem. Nesse dia todos foram para a cama cedo, com a certeza de que o dia seguinte iria ser um bocadinho menos difícil. E assim foi durante toda a semana. Pais e filhos ficaram um bocadinho mais crescidos durante aqueles dias".


Esta tem sido a realidade de muitas famílias nas últimas semanas. Muitos pais identificar-se-ão com este cenário, para outros, o cenário foi bem mais trágico, com muito choro à mistura. E nos dias seguintes ao fim de semana, a tendência é sentir que os passos que todos deram em frente, parecem voltar para trás.

O processo de adaptação à creche e escola, para algumas crianças é mais rápido, para outras é mais lento.

Existem alguns fatores que facilitam uma adaptação e integração positiva das crianças e dos pais á nova realidade:

A idade certa

Não é possível indicar a idade ideal para a entrada na creche ou no jardim de infância. Quando a criança deixa de depender do leite materno e começa a introduzir os alimentos, a ida para a creche é uma opção, embora muitos bebés se estreiem ainda durante o período de amamentação. Pela questão afetiva e da vinculação, quanto mais tempo as crianças puderem ficar com a mãe ou com outros cuidadores da família que respeitem as necessidades e etapas do desenvolvimento do bebé e da criança, mais nutrida a mesma ficará. Todavia, não existem dados que indiquem que a entrada para a creche esteja associada a experiências negativas para os bebés, tal como concluiu um estudo do National Institute of Child Health and Human Development (Estados Unidos), que seguiu mais de mil bebés e crianças com idades entre um mês e os quatro anos e meio, entre 1991 e 2007. O mesmo estudo parece indicar que não foram encontradas diferenças de desenvolvimento entre as crianças que ficaram ao cuidado das mães e as que receberam cuidados externos desde tenra idade.

Assim, o mais importante para a criança é que quer no contexto familiar, quer numa creche e/ou jardim de infância, os cuidadores, respeitem as suas necessidades e acompanhem as etapas de desenvolvimento dos bebés e/ou crianças, estimulando-as tendo em conta o seu ritmo e características.

Tempos livres nas férias

23.8.18

Se por um lado férias são sinónimo de descanso e de cortar com a rotina do dia a dia, quando se tem filhos ou crianças por perto, nem sempre é fácil conseguir os tão desejados momentos de tranquilidade. Se os pais passam o ano inteiro a desejar que o momento das férias chegue, o mesmo acontece com as crianças, que vêm as férias com os pais ou com outros adultos com quem costumam estar de férias, como uma oportunidade de estarem mais próximas dos pais e de poderem fazer coisas em conjunto que normalmente não fazem.

O que acontece atualmente é que geralmente esta proximidade e companhia entre adultos e crianças é apenas aparente, uma vez que apesar de se partilhar o mesmo espaço, a presença e a atenção, na maioria das vezes, está centrada nos aparelhos eletrónicos como o telemóvel, o tablet ou a playstation. Há mais partilhas no Facebook, Instagram e Whatsapp do que propriamente a partilha de tempo, de experiências e de afetos.

Os aparelhos tecnológicos não são exclusivos do mundo lúdico das crianças e jovens do século XXI, sendo algo que tem acompanhado o crescimento das últimas gerações. Nas décadas de 80 e 90 (gerações da maioria dos pais de hoje em dia), já muito do tempo das férias era passado em frente à TV a pôr os episódios do Dragon Ball em dia, ou a ultrapassar os níveis do super mario bros, do tétris e do pac-man.

Um baralho de cartas, uma caixa de loto ou de dominó, jogos de tabuleiro como o monopoly, damas ou xadrez faziam parte da decoração de qualquer casa. Muitos destes jogos, jogados entre amigos ou família, preenchiam os serões das férias, animando e aproximando verdadeiramente as crianças dos adultos que se dedicavam àqueles momentos para se divertirem, apesar do cansaço da praia ou dos passeios típicos das férias de verão. É provável que os adultos se divertissem mais do que as crianças, ficando o gostinho de na noite seguinte haver a desforra saúdavel de quem tinha perdido no dia anterior.

Para além de todo este leque de atividades mais individuais ou em grupo, havia todo um mundo lá fora para ser explorado, distante do sofá e das quatro paredes de casa, que apelavam ao sentido de aventura, de descoberta e de criatividade das crianças, e à gestão da frustração de quando de facto não há nada planeado para fazer. Os rapazes com os jogos de futebol, os peões, berlindes ou corridas de carro, as meninas a saltar à corda, ao elástico, a brincar aos pais e às mães, a dançar ou a cantar.

A Escola dos "grandes"

20.6.18

O sistema educativo português oferece um ensino gratuito a partir dos três anos de idade, dando-se início ao ensino pré escolar. Este período sério de aprendizagem através da brincadeira e do desenvolvimento de competências motoras, linguísticas, emocionais e sociais, representa uma fase de muita importância, se não a mais importante, no desenvolvimento socioeducativo de uma criança. É neste período que se lançam as sementes que depois irão florescer ao longo do percurso escolar e educativo das crianças.

Aos seis anos em Portugal, sete, noutros países, tal como a Finlândia, as crianças integram o primeiro de quatro ciclos de escolaridade obrigatórios, segundo a lei atual portuguesa: 1º, 2º e 3º ciclos do ensino básicos e o ensino secundário. Nesta fase, supostamente a criança atinge a maturidade cerebral que a permite avançar nos conhecimentos que se irão tornar cada vez mais complexos e abstratos e também deverá ter uma maturidade emocional para lidar com a resolução de problemas, a gestão da frustração, o autocontrolo e a autonomia que a entrada para a escola exige.

Neste sentido, quer a entrada para o jardim de infância (creche), quer para o primeiro ciclo são momentos vividos com alguma ansiedade e preocupações para os pais que, consequentemente, pode ter impacto nas crianças. São períodos de decisão difíceis, em que é exigidos às crianças e aos pais um corte com uma certa zona de conforto e de controlo relativamente à sua educação e desenvolvimento.

Contudo, a boa notícia é que, por norma, com quanto mais naturalidade estas etapas forem vividas, maior é a probabilidade de as coisas correrem bem. Como é natural, há sempre um período de adaptação para todos (crianças, pais e restante família, educadores e professores, etc) que deve ser respeitado.

Por esta altura, várias são as famílias que estão perante esta tomada de decisão: Os pais das crianças de 2/3 anos que têm tido o privilégio de estar em casa com os avós, amas ou outros familiares que se questionam se estará no momento do seu filho conviver com outras crianças num ambiente de aprendizagem e de estimulação cognitiva, que é sempre diferente daquela que se tem no contexto familiar (a não ser que o cuidador da criança tenha formação pedagógica e desenvolva essas competências, tal como acontece no ensino doméstico, sendo este uma opção cada vez mais procurada por famílias portuguesas), assim como o caso das crianças com 5/6 anos que pela sua idade poderão estar em situação de matrícula no 1º ano de escolaridade. À partida, qualquer criança que faça 6 anos até ao dia 15 de Setembro do ano letivo que inicia, estará em condições de se matricular no 1º ciclo. Os alunos que celebrarem o seu aniversário após essa data, poderão ou não optar pela matrícula no 1º ano, sendo que no caso da inscrição, existe o risco de não conseguirem vaga, uma vez que são alunos condicionais, não sendo considerados como prioritários. Neste caso, será importante realizar a matrícula em mais do que um estabelecimento de ensino, e simultaneamente no jardim de infância, para que possa ter sempre uma vaga garantida no ensino público.

Foquemo-nos na entrada para a segunda “Escola dos Grandes” (1°ano):

Como saber se é o momento certo?
A resposta está inteiramente no seu filho. Cada criança é única e especial, sendo importante conhecê-la nas suas diferentes dimensões e para isso, por vezes é importante recorrer à opinião da educadora, dos médicos e outros técnicos que acompanham a criança, assim como à opinião dos familiares próximos e atentos ao desenvolvimento da criança. A decisão será sempre sua, mas não se esqueça que conhece o seu filho enquanto filho, mas que também é importante ter uma perspetiva da criança noutros papéis sociais, nomeadamente enquanto aluno. A educadora pode ser uma grande aliada nesta tomada de decisão, tendo um conhecimento aprofundado das dimensões cognitivas, sociais e emocionais da criança. Estas três dimensões envolvem competências tais como: a motricidade, a linguagem, o raciocínio, a atenção, a memória, a resistência à frustração, a persistência na tarefa, o conseguir controlar os seus impulsos, a autonomia, a socialização, entre outras.

Como se vê, são precisos vários requisitos para que a entrada para a escola possa ser feita com alguma segurança, no entanto, nem todas as crianças atingem os mesmos patamares na mesma altura nem da mesma forma, sendo, por isso, importante conhecer bem a criança e sobretudo não ter pressa de saltar etapas nem que ela cresça depressa ou devagar demais. Respeitar o ritmo do seu filho pode ser uma importante aprendizagem e, geralmente, é sempre a decisão mais acertada.


O que muda na entrada para a escola?

O espaço normalmente é uma mudança de peso na entrada para a escola. Muitas vezes é dentro do mesmo recinto onde a criança frequentou o jardim de infância, contudo, o edifício muda assim como a própria imagem da sala de aula. A principal diferença, na maioria das escolas, é que de uma disposição de mesas em grupo, passa-se para mesas individuais ou a pares, o famoso tapete e os adorados cantinhos de brincadeira desaparecem para dar lugar a móveis de organização para os livros e cadernos escolares. No ensino tradicional, a sala passa a ser um lugar de trabalho em que os brinquedos ficam apenas a assistir, tendo a brincadeira lugar apenas no recreio, que parece sempre pouco para a energia que há para gastar. Pode ser importante fazer uma visita com o seu filhos, à escola/instalações novas para que o conhecimento prévio do espaço possam trazer maior segurança para todos.

Na maioria das escolas os horários são mais rígidos relativamente ao jardim de infância e as orientações das escolas regem-se pelo estatuto do aluno que prevê aspetos tais como as faltas, a (in)disciplina, a participação do encarregado de educação na vida escolar do aluno, etc. Seja um modelo para o seu filho relativamente ao respeito a ter pela instituição escolar e pelo direito de aprender: respeite os horários, faça um esforço por entender as regras e normas da escola, passando essa mensagem ao seu filho, reforçando sempre a importância da figura do professor.

Os conteúdos pedagógicos alargam-se e aprofundam-se. São solicitadas cada vez mais competências às crianças para que possam acompanhar um currículo que por vezes vai para além do que é possível exigir ao cérebro de uma criança. Todavia, a possibilidade de evolução e a sensação de progresso é das sensações melhores que se poderá dar a uma criança em idade escolar. A partir de agora, poderão ser elas a ensinar os adultos certas coisas que estes há tanto tempo já se esqueceram. Isso traz-lhes uma sensação muito grande de eficácia e de importância. Permita que o seu filho fale consigo e lhe mostre o que aprendeu, reforce o quão importante é cada aprendizagem e faça um elogio por cada vitória alcançada.

Terrible Two

2.5.18
Queridos Pais, família e amigos,

Já tenho dois anos.

Conseguem ver como já estou um crescido?

As minhas pernas acompanham-me na exploração de todo um mundo por descobrir, o meu vocabulário aumenta dia após dia, permitindo-me comunicar com os outros cada vez melhor, sendo capaz de expressar os meus desejos e as minhas necessidades para que possam ser atendidas. A minha coordenação motora deixa-me fazer coisas que são muito divertidas para mim tais como correr e saltar. É nesta descoberta de mim e do mundo que ganho cada vez mais consciência de que sou um ser único e individual, ou seja, não sou uma continuação da mãe. Mais para o final, começo a referir-me a mim próprio na primeira pessoa do singular, afirmante perante todos que EU existo.

Look | Zara 


Começo também a perceber que para além de mim, existem os outros, mas acho que o mundo serve para me satisfazer e que as coisas têm de ser como eu quero. Sim, é verdade, também já tenho vontade própria e sei dizer o que quero e o que não quero, o que gosto e o que não gosto, mesmo que vocês não concordem comigo, como acontece tantas vezes…

Estas minhas descobertas, fazem com que me torne mais independente e autónomo, querendo fazer e experimentar as coisas por mim…no entanto, nem sempre estou preparado para o fazer sozinho. Tomo consciência das minhas limitações e isso deixa-me zangado.

É por isso que, mesmo que queira ir sozinho a algum lado, preciso que venham comigo. Mas que me fiquem só a ver. Preciso de vocês mais do que nunca! Preciso que a vossa segurança me faça acreditar em mim! Preciso que a frase “Eu consigo” se junte a tantas outras que já aprendi. Deixem-me perceber o que sou ou não sou capaz, preciso de experimentar, de cair e de aprender a levantar-me! Vou descobrir que existe uma coisa que se chama causa-efeito e que se eu fizer uma coisa, isso terá um determinado resultado. É por isso que começo a achar graça em deixar cair coisas para o chão de propósito. Percebo que a partir de algo que faço, acontece alguma coisa. A noção de consequência será muito importante para o meu futuro.

Sabem, o confronto entre o que quero e o que não consigo fazer conduz-me a tempestades existenciais.

Look | Be Chic



À medida que vou sendo capaz de controlar a minha vontade de fazer chichi e cocó e de fazê-lo no sítio adequado, percebo que consigo controlar as minhas vontades e que tenho capacidade para gerir o que se passa no meu corpo. Ainda não sei muito bem é como é que isso se faz.

Por falar nisso, sinto muitas vezes coisas estranhas dentro de mim…ouvi dizer que se chamam emoções. Não sei bem o que isso quer dizer, só sei que umas fazem-me chorar, outras fazem-me gritar, outras fazem-me dar muitas gargalhadas, outras faze-me correr para o vosso colo à procura de proteção. Preciso que me levem a sério, e que me digam o nome de todas elas quando as estou a sentir e me expliquem porque as estou a sentir. Só assim poderei reconhecer as minhas emoções e as dos outros. Sei que isso fará de mim uma pessoa melhor e mais sociável.

Preciso também que me ensinem como devo conduzir estas emoções. Não sei o que fazer quando não consigo o que quero. Então choro, grito, mordo, bato, atiro-me para o chão e depois parece que entro para um labirinto de onde sinto que não consigo sair sozinho. Isso faz-me sentir ainda mais assustado. Se me ajudarem a controlar os meus impulsos, vou aprender a acalmar-me e a encontrar uma solução. A minha agressividade é a manifestação da minha incapacidade para lidar com o que estou a sentir e a pensar, não é nada pessoal contra vocês. Deixem-me expressar o que sinto, mas com limites. Preciso de perceber até onde posso ir. Abracem-me, segurem-me na mão, coloquem-me no quarto por um bocadinho para que a parte do meu cérebro racional me faça sentir disponível para vos ouvir.

Por vezes vocês não sabem como agir comigo nesses momentos. Dizem muitas vezes que estou a fazer birra e sei que por cansaço e desespero às vezes também gritam comigo e me dão uma palmada. Há dias em que parecemos 3 bebés lá em casa.

Sei que estão a dar o vosso melhor, e também a aprender a gerir as vossas emoções comigo, mas há atitudes vossas que não me ajudam a crescer de uma forma saudável e a saber como agir da próxima vez que não me fizerem a vontade.

Como dizia um Doutor muito conhecido, na minha idade a disciplina faz-se olhos nos olhos, mão na mão e ombro a ombro. Vale a pena que me expliquem as coisas com as palavras, para que, com o tempo, o seu significado seja entendido mas preciso que me peguem pela mão, pelos ombros para me travarem de alguma ação indesejada, que me peguem ao colo, que me abracem e me expliquem o que se passa comigo e o que pretendem de mim. Quando eu pedir alguma coisa que não pode ser, não digam só que não, expliquem-me porquê, dêem-me alternativas, promovam a minha capacidade de escolha e de responsabilização pela minha escolha, e sobretudo não me humilhem. Como se iriam sentir se, no trabalho, o vosso chefe dissesse à vossa frente, a todos os colegas que vocês fizeram alguma coisa mal

Não faz mal ser diferente

15.3.18


“Não faz mal ser diferente. Tu és especial e importante por seres quem és” 
 (Todd Parr)

Somos quem somos devido a um conjunto de vários fatores tais como o nosso nome, o país em que nascemos, a etnia, o nosso género, a nossa orientação sexual, a nossa genética que define a nossa altura, a cor dos olhos, a cor do cabelo, a cor da pele, a forma como nos movimentamos. Somos o que somos pelo contexto em que crescemos, o que vestimos, o que comemos, o que gostamos de fazer, os sítios onde gostamos de ir, aquilo que dizemos, sentimos, pensamos e fazemos. Somos quem somos pelas oportunidades e pelas experiências que colecionamos desde o período da gestação. Somos quem somos entre as nossas capacidades e dificuldades.

É na primeira infância (desde o nascimento até aos 6 anos de vida), que a estrutura da personalidade de uma criança é construída com a ajuda dos seus principais cuidadores (pais, familiares próximos e educadores de infância). Até esse momento as crianças observam os adultos que a rodeiam, absorvendo cada detalhe daquilo que dizem e que fazem. É nesta fase, até cerca dos 8 anos que as crianças constroem a sua visão de si próprias, dos outros e do mundo. É também nesta etapa que os alicerces são construídos e que ficarão para a vida. E é principalmente também durante esta fase que as crianças merecem e precisam de ser nutridas de afeto, de segurança e de reconhecimento por aquilo que são, não podendo haver espaço para dúvidas de que são seres únicos e especiais. Todas as crianças o são, sem exceção, independentemente da cor da sua pele, do seu grau de saúde, da roupa que vestem ou do contexto em que estão inseridos. É nesta diversidade de seres que nascem as comparações feitas, inicialmente pelos pais e familiares, e que posteriormente têm impacto na formação da personalidade das crianças e na forma como interagem entre si e consigo próprias.

Desde bebés que as crianças tendem a ser comparadas entre si pela sociedade: os que dormem bem e os que dão noites más, os que começaram a andar antes de completarem um ano e os que aos dois ainda se arrastam no chão, os que já falam e os que parecem não querer dar o ar da sua graça, os que crescem numa família tradicional e os que cujos pais se separaram e que têm agora duas casas, os que comem carne e os que são vegetarianos, os que usam roupa e equipamentos eletrónicos de marca e os que não, os que já sabem as letras e os que só gostam de brincar na escola, os que agem de acordo com o que o adulto espera, e os que fogem das expetativas, os que se portam mal e os que “não dão trabalho nenhum”, os que são “normais” e os “outros”. As crianças crescem, neste vai e vem de informações, integrando a ideia de que uns são bons e os outros são maus, e que uns são mais importantes do que os outros. 



Educar com AMOR

21.2.18
Quantas palavras e gestos cabem na palavra amor? 
Qual a sua importância no desenvolvimento de uma criança? 
Que marcas deixa o afeto ou a falta dele? 
Quando nasce o amor dos pais pelos filhos?

Para muitos pais, nasce no momento em que descobrem que estão “grávidos”, para outros quando veem o bebé pela primeira vez, para outros está longe de ser um amor “à primeira vista”, sendo um sentimento que aparece com o tempo, e para muitos outros, nunca chega… Os filhos, de acordo com as suas características, são um espelho das experiências que vivenciam e que observam, respondendo aos estímulos que recebem dos pais ou dos seus cuidadores. Todas as crianças nascem com capacidade para amar e para viverem as suas relações com base no afeto, são elas que genuinamente nos remetem para a simplicidade da vida e da afetividade, contudo, nem sempre as suas vivências e contextos permitem que os alicerces da sua educação sejam o amor e o afeto. Há crianças que desconhecem a palavra amor, não no que diz respeito à sua ortografia, mas em relação à sua semântica. São braços e olhares tristes, vazios, perdidos e zangados, embora, muitas vezes tenham os quartos e os seus dias bastantes cheios e preenchidos.

Quando se começa a construir uma casa, parece evidente que a primeira coisa a fazer é colocar os alicerces e quanto mais fortes e consistentes forem, mais segura será a casa. Cada um de nós representa essa casa, o espaço que iremos habitar durante toda a nossa vida, em que os pais são os primeiros e principais arquitetos e construtores. Não interessa se são casas grandes ou pequenas, com piscina ou com jardim. O que importa é que sejam casas firmes e onde nos sentimos bem. Esse é o papel da educação na vida de uma criança.

Sabe-se que o afeto tem um papel determinante no desenvolvimento cognitivo, social e emocional das crianças, e que influência o seu nível de bem estar ao longo da vida. A demonstração de afeto começa ainda dentro da barriga da mãe, dependendo da forma como esta vivência a sua gravidez e com os sentimentos associados à gestação e à chegada de um filho. Se a mãe experienciar sentimentos de felicidade e de tranquilidade irá produzir serotonina e dopamina ou, se pelo contrário, sentir ansiedade e tristeza o seu ritmo cardíaco e a adrenalina em excesso irão chegar até ao bebé através do cordão umbilical. A voz e o tato são os primeiros sentidos a serem desenvolvidos e através dos quais os pais, familiares e amigos poderão comunicar e manifestar afeto ao bebé. Ainda que os bebés não decifrem as palavras, ou a memória possa não estar completamente desenvolvida, há indícios de que os bebés posteriormente reconhecem as vibrações sonoras de sons que ouviram enquanto estavam dentro da barriga da mãe e aos quais reagem positivamente.

A partir do momento em que o bebé nasce, poderão ser várias as manifestações de amor e de afeto: a satisfação das suas necessidades, o contacto físico através do toque e do colo, a expressão facial (sorrir), a interação com o bebé e a promoção de um ambiente calmo e harmonioso.

A importância do afeto nas primeiras etapas do desenvolvimento foi analisada numa experiência em 1963-1965 por um psicólogo, com macacos rhesus. Na sua experiência, o psicólogo criou duas mães artificiais de macacos rhesus: uma feita de arame e a outra feita igualmente de arame mas forrada com pano macio e felpudo. Harry Harlow observou que os macacos bebés preferiam claramente as “mães” mais confortáveis, revestidas com pano. Esta preferência mantinha-se independentemente de qual a mãe que fornecia o alimento, o que parece indicar que a necessidade afetiva poderá prevalecer relativamente à necessidade alimentar.

Ao longo do seu desenvolvimento, e de acordo com a faixa etária, o amor por um filho poderá traduzir-se em muitas outras palavras, gestos e atitudes dos pais para com os filhos que, posteriormente terão retorno na relação e na dinâmica familiar e no desenvolvimento socio emocional das crianças. Alguns gestos e hábitos da lista que se segue, poderão ser questionados pelos pais, que muitas vezes consideram que, por exemplo, a rigidez no que diz respeito às regras poderá não representar um ato de amor para com os seus filhos, contudo, a exigência do cumprimento das regras poderá dar tanta ou mais segurança a uma criança do que o colo de uma mãe quando o filho se magoou ou está doente.

A educação com base no afeto e no amor têm exatamente um único fim: o de contribuir para que as crianças sejam mais felizes, otimistas, afetivas, confiantes, seguras e capazes de construírem relações positivas e sólidas.